14/11/2010

Janela Crítica - BRA 02 – Guiados por Vozes


Pensando no poder transformador que a música exerce sobre seus ouvintes, os curtas a seguir dispõem das mais diversas formas para traduzir esse sentimento de influência que ela exerce sobre nós.

No documentário com toques ficcionais Áurea (Zeca Ferreira, 2009), vemos e ouvimos uma cantora de bar apaixonada pelo seu ofício contar e cantar sua história equilibrando-se entre depoimentos e reconstituições de época em que ela e seus amigos de carreira interpretam a si mesmos. Esta declaração de amor à música, no entanto, permanece como uma experiência excessivamente estética que termina perdendo em espontaneidade: os enquadramentos, fotografia, figurino e posicionamento dos depoentes milimetricamente planejados não auxiliam na emergência de um sentimento verdadeiro diante da câmera. Apenas observamos uma versão que aquelas pessoas criaram para si mesmas, pois, talvez tão preocupadas com suas próprias imagens na tela, tenham esquecido de mostrar seu eu mais verdadeiro.

Apropriando-se do tema da arte como uma forma de expressão e contestação, RAZ (André Lavaquial, 2010) desloca a intenção original do diretor – tratar dos adolescentes romenos que cantam nos metrôs em Paris a fim de sobreviver – para outra realidade: as favelas no Rio de Janeiro. Enquanto luta para construir uma vida diferente para si mesmo, RAZ perde seu rádio no meio da cidade e encontra, através das estátuas vivas, outra ferramenta - uma vitrola e discos de vinil - que pode lhe proporcionar a sobrevivência. Com imagens que mesclam sonho e realidade com muita propriedade, Lavaquial realiza uma jornada musical por diversos ritmos ao longo de um dia na vida de um adolescente que deseja simplesmente sair, escapar de uma vida de desconforto e melhorar. Contudo, talvez seu impacto fosse maior se sua proposta original fosse executada, já que esta estratégia de sobrevivência já se tornou usual no Brasil, mas observar este tipo de trabalho na França é algo diferente e que causaria um estranhamento que favoreceria a mensagem do curta.

Trabalhando novamente com a poesia imagética e sonora que a Ave Maria ou Mãe dos Sertanejos (Camilo Cavalcante, 2009) proporciona, Camilo traz um painel do sertanejo sofredor e trabalhador que encontra na religiosidade uma esperança de seguir em frente, ainda que ele não esteja distanciado do restante do mundo – como atesta o final do curta. Bela fotografia, montagem e som, mas com uma representação do Nordeste que já estamos acostumados a ver.

Versando sobre a incomunicabilidade entre duas pessoas que falam idiomas diferentes e o surgimento de uma amizade entre elas, o curta A Amiga Americana (Ivo Lopes e Ricardo Pretti, 2009) termina por se tornar um retrato simplista que pouco oferece ao seu público. Seu diretor parece não confiar na imagem e na montagem e subestima seu espectador com letreiros que explicam em demasia o enredo, que, por si só, já apresenta falhas graves na construção das personagens e das situações, algo que as atrizes também não conseguem melhorar. E, ao final, num ponto de virada abrupto e deslocado, Paris afirma que aprendeu muito com Thais e seu filho Ian sobre formar uma família e criar laços – sendo que, em nenhum momento anterior, ela parece demonstrar alguma ‘necessidade’ de aprendizado, tornando seu desenvolvimento frágil –, mas vai embora para procurar praias e não algum relacionamento rompido ou novo. Uma proposta inicial interessante, mas que parece ter se perdido ao longo da execução do trabalho.

Nenhum comentário:

Postar um comentário