16/04/2010

Up e os ensaios para a vida


Como seres humanos, realizamos diversos planos para nossas vidas, como se estivéssemos sempre nos preparando para algo posterior que será chamado, de fato, nossas vidas. Fazemos projetos para viajar, experimentar, como se tudo o que estivéssemos fazendo antes disso não fizesse parte do viver, do estar vivo.

Carl Fredricksen planejou com sua esposa diversas viagens que seriam feitas ao longo dos anos, porém os diversos fatos que ocorreram com eles terminaram por adiar constantemente seus projetos, conforme mostrado em uma bela elipse logo no início de filme, que sintetiza de maneira emocionante diversas fases dramáticas de ambos com sutileza e habilidade. Anos depois, conhecemos a pessoa que Karl se tornou ao longo dos anos: ranzinza e afastado do convívio com outras pessoas. No entanto, ele começa a relembrar seu passado e, mesmo com o peso da idade, decide fazer algo inóspito: amarrar uma imensa quantidade de balões no telhado de sua casa e sobrevoar diversos lugares para viver grandes aventuras. Acompanhado por Russell, um escoteiro que precisa angariar reconhecimento para que obtenha suas medalhas de honra ao mérito, este protagonista excêntrico leva o espectador para uma jornada divertida e dinâmica, onde encontram um cachorro que, com um aparelho eletrônico, consegue falar; uma ave rara procurada por diversos exploradores, como Charles Muntz, grande herói de Karl em sua juventude.

Optando por um ar mais caricatural e cômico do que naturalista, Pete Docter e Bob Peterson utilizam o cartum como forma de aproximação imediata do público com suas personagens, fazendo de suas formas corporais um reflexo de sua interioridade. Enquanto Karl apresenta feições mais retas e rígidas que demonstram seu caráter rabugento, o menino, o cachorro e a ave possuem feições mais arredondadas, que demonstram leveza e flexibilidade diante das situações que surgem em seu caminho. No desenvolver do enredo, o roteirista consegue tornar clara as nuances que seu protagonista obtem, além de incluir diversas situações que exploram as infinitas possibilidades de enredo conseguem de forma criativa, sem precisar apelar para uma fragilidade das narrativas episódicas típicas dos road movies.

Mesmo que não apresente a genialidade de Wall-E ou Ratatouille, a Pixar constrói uma animação acima da média, que diverte e faz refletir na mesma medida, levando seu espectador a sair do cinema com desejo de aproveitar melhor o dom da vida, e não permanecer em um constante ensaio para um plano futuro. Sua essência não se trata simplesmente de aproveitar a vida enquanto se pode, mas de usufruir de seus benefícios em qualquer momento.

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